terça-feira, 20 de abril de 2010

CÉLULAS-TRONCO: Ciência e Religião



O uso de embriões para pesquisas é um dos temas mais complicados da Bioética, pois envolve o estágio inicial da vida, daí a posição de quase todas as crenças religiosas no sentido de condenar essa nova abordagem. Os cientistas, contudo, apostam nas possibilidades advindas da investigação sobre as células embrionárias, vislumbrando grandes avanços no tratamento e na cura de doenças como Mal de Parkinson e Alzheimer, diabetes, doenças degenerativas e cardíacas, medula seccionada, entre outras.
Pesquisadores, médicos, teólogos, representantes da Igreja, professores e doutores apresentam seus argumentos contra e a favor, para aprofundar o debate sobre uma decisão que surpreendeu mesmo os pesquisadores, já que a questão das células-tronco embrionárias apareceu infiltrada no projeto de lei que contempla majoritariamente as atividades envolvendo os organismos geneticamente modificados. A forma como a novidade foi apresentada levanta também uma série de questionamentos de ordem jurídica e legal, principalmente pela total inexistência no país de uma legislação mais ampla sobre embriões, que regule, por exemplo, a prática da reprodução assistida.

CIÊNCIA
Longe de haver um consenso, o fato é que a lei gerou grandes expectativas e agora os pesquisadores têm sinal verde para trabalhar. Do ponto de vista científico a aprovação da lei foi um avanço.
A utilização terapêutica de células-tronco, e aí se incluem as células-tronco adultas encontradas no organismo e no cordão umbilical, representam uma revolução dentro da Medicina para doenças que se tornam cada dia mais freqüentes e para as quais, hoje, não existe nenhuma esperança de cura.
Com a pesquisa da célula-tronco existe uma esperança - a de que a partir dessas células sejam produzidos milhões de outras do tecido nervoso, e que, implantadas no local da lesão, passariam a cumprir a função de transmitir os impulsos nervosos.
Com as células-tronco existe uma expectativa real de que o diabetes tenha um tratamento e que a pessoa não precise tomar insulina o resto da vida. Até mesmo para o câncer essas pesquisas podem ser animadoras.
Não há dúvidas quanto ao potencial das células-tronco e aos novos rumos que elas podem dar à biotecnologia. A Igreja, inclusive, vê com bons olhos as pesquisas com as células adultas.
O grande dilema é que, segundo os cientistas, o melhor tipo de célula-tronco se encontra no embrião. O poder de diferenciação das células embrionárias é a principal justificativa para que se procedam as investigações nesse campo, mas os cientistas sabem que quanto maior o potencial de diferenciação de uma célula maior é o risco dela dar origem a um tumor.
Ao contrário das embrionárias, as adultas não têm capacidade de se transformar em qualquer tecido do corpo. Em compensação, elas têm seus aspectos negativos reduzidos. A célula adulta, pelo próprio processo da vida, já teve bloqueados vários genes relacionados, por exemplo, a câncer (os chamados oncogenes). E no caso das células-tronco embrionárias, esses genes que podem resultar na formação de tumores, não estão bloqueados, estão absolutamente livres.

RELIGIÃO
Pouco antes da Lei da Biossegurança ser levada à votação, os setores da Igreja foram os primeiros a se mobilizar contra a aprovação do artigo 5º, que autoriza as pesquisas com células-tronco embrionárias. Em carta dirigida aos deputados e senadores, dias antes da votação, a Confederação Nacional dos Bispos do Brasil clama pelo bom senso dos parlamentares.
A Igreja Católica tem uma posição firme não só contra a utilização de embriões para pesquisas, como contra a própria fertilização in vitro, técnicas de clonagem terapêutica e, evidentemente, contra a clonagem humana. Do ponto de vista do espiritismo, a utilização de embriões em pesquisas também é rejeitada. Segundo a filosofia kardecista, basta o magnetismo dos pais e o desejo do espírito para que se dê a reencarnação. As revelações espirituais dizem que o espírito reencarnante se une ao corpo no momento da concepção, isto é, no instante da formação do zigoto ou célula-ovo, e só o espírito tem o poder de agregar matéria. Portanto, para os espiritualistas, esse processo pode ocorrer mesmo no laboratório. Em princípio, consideram que descartar um embrião fertilizado fora do útero da mãe é o mesmo que promover um aborto. Entretanto, há outra revelação: a de que nem todos os embriões têm um espírito ligado.
O princípio de que a vida começa no primeiro instante da fecundação permeia os fundamentos de muitas religiões, mas é possível encontrar posições mais flexíveis. É o caso do judaísmo, que aplica status diferente ao embrião, ao feto e ao recém-nascido. À medida que a gravidez evolui, o organismo adquire um status superior. Inclusive, se durante a gestação ocorre uma situação em que há um risco de vida para a mãe, o judaísmo privilegia a mãe em oposição ao feto. No começo, até 40 dias depois da fecundação, é como se o embrião fosse apenas água e não vida. Tanto que a pesquisa com embriões, inclusive com uso de células-tronco, bem como procedimentos de clonagem terapêutica, são permitidos em Israel. Mas é importante ressaltar que não se trata de uma postura unânime. Há posições contrárias de judeus ortodoxos que acreditam que a vida começa mesmo no momento da fecundação.

Um comentário:

  1. Ótimo artigo sobre células-tronco. Poderia explorar mais a questão do posicionamento do Acordão do STF, que permite a utilização de embriões para pesquisas.

    ResponderExcluir